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Arvore De Letras

Coisas lidas,ouvidas,cantadas, declamadas,faladas,escritas

Arvore De Letras

Coisas lidas,ouvidas,cantadas, declamadas,faladas,escritas

20
Nov09

Pássaros de seda Rosa Lobato Faria V

AnnaTree

Coisas Lidas

 

Um ano inteiro vivemos juntos á beira do rio, nunca lhe pedi explicações porque o mistério é o mistério, da pele costurou o colete que nunca mais larguei, ensinou-me tudo sobre o amor, a terra, a floresta, a savana e o rio, ensinou-me, na verdade, tudo quanto sei e a paixão que tinha para viver, vivi-a toda naquele ano, naquela terra quente á beira daquele rio.
Uma madrugada, que recordo como a mais triste de toda a minha vida, não sentiu a sua cabeça na cova do meu ombro, nem na sua coxa sobre a minha coxa, nem a sua mão pousada no meu peito. Abri os olhos sobressaltado, sai da cabana, chamei. Mas apenas vi do outro lado do rio, uma zebra q eu se afastava na luz quieta da primeira manhã.

18
Nov09

Pássaros de seda Rosa Lobato Faria IV

AnnaTree

Coisas Lidas
(...)
Uma vez em África andava eu no mato, quando vejo uma zebra maluca as cabeçadas as arvores e afligi-me todo porque o animal nao era dali e ia espatifar-se fora do seu horizonte.
Alto, bicho bonito! Vem ao pé de mim que te levo para a tua savana, nem que nessa caminhada demore o resto da minha vida. Olhou-me com os olhos tão meigos que vi logo que me tinha entendido, os animais entendem as palavras e as intenções por detrás delas, caminhou ao meu lado como burro doméstico, era uma fêmea, ao fim de três horas ajoelhou para que eu montasse. E assim andamos dois dias, dorme aqui, avança acolá, cheirávamos a água do rio mas não alcançávamos de lá chegar, ao terceiro dia, mais mortos que vivos, avistamos a margem e bebemos.
Do outro lado da savana, a zebra havia de atravessar a nado, eu voltaria para trás, mas não sei porque deu-me um nó na garganta e á zebra também, que me rodeava a cabeça no meu peito e não partia.
Fui á caça de alguma coisa para comer, depenei o meu pássaro, fiz uma fogueira para assa-lo, pensei. Agora vai fugir com medo do lume, mas não, deitou-se ao meu lado como se esperasse alguém ou alguma coisa. Porque já sabia que me escutava falei-lhe de manso, zebra minha amada, a tua vida não é deste lado do rio, tens que ir – te á procura dos teus, ninguém vive bem sozinho e uma zebra muito menos, tens a tua manada, todas as riscas bonitas como tu, pretas e brancas, a explicar aos homens que preto e branco se misturam na maior beleza, eu sei que és minha amiga e que me estas agradecida, mas chegou a hora de dizermos adeus. Correu um pouco pela margem, experimentou a agua. Agora é que vai, qual que, eu estava deitado com as mãos debaixo da nuca, voltou para trás, deitou-se, pousou a cabeça no meu peito e adormeceu.
Era um peso enorme, mas não quis enxota-la, havia de parecer – lhe ingratidão, lá adormeci e á medida que dormia o peso fez-se mais leve e no meio da noite acordei de repente e tinha uma mulher nos meus braços e uma pele de zebra a cobrir-nos aos dois. Ela era negra, linda, macia e cheirosa, apertou contra o meu o seu corpo nu e ali nos amamos e nunca, nos dias da minha vida, amei nenhuma que se lhe comparasse.

 

16
Nov09

Pássaros de seda Rosa Lobato FariaIII

AnnaTree

Coisas Lidas


De repente tudo se tornou claro. Quando escreveu isto, o Mário sabia que ia morrer, pensou Diamantina. De facto ele entregou-me um livro com o seu sorrisinho bizarro. E despediu-se de mim, desejou-me boa viagem e partiu. Depois, á chegada do Brasil, tive a notícia da sua morte. Morreu de repente, disse a Tiana e eu tão egoísta que nem quis saber pormenores, muito ocupada com o meu desgosto. Não fui á pedra da moura como devia ter isso, nem sequer li o livro dele a tempo de lhe dizer, ainda em vida...dizer o que? Que não podia ama-lo? Que ele era o meu irmão muito querido, a melhor pessoa que conheci e que eu o não merecia por ser tão de carne e osso, tão cheia de fraquezas, um pobre cisne a quem nunca caíram as penas pardas e baças? Podia pedir-te perdão, Mário, mas tu já me perdoaste tanto, que posso adivinhar que me perdoaste tudo

 

14
Nov09

passaros de seda de rosa lobato fariaII

AnnaTree

. Coisas Lidas

 

Não te vejo nenhuma pena baça, disse eu, á falta de melhor, o que eu queria dizer-lhe era amo-te, desejo-te, morro de cada vez que me olhas, as tuas mãos macias como asas de pena doce despertam em mim o som de mil cordas de violino, ou é o rumor branco do meu sangue a soluçar.
Foi por esse tempo que a minha mãe começou a tomar muita conta de mim, evitando que eu e a Diamantina ficássemos sozinhos, mas não era preciso, á Diamantina nunca lhe ocorreu que eu era um homem, eu era só o Mário, nada parecido com os actores das fitas americanas e os príncipes das histórias, o Mário feiosinho, baixote e aos quinze anos com meia dúzia de borbulhas que haviam de transformar-se nas barbas que hoje ainda uso e de que a Diamantina não gosta. Mas de que outro estratagema poderia eu deitar mão para esconder-me dela, poupa-la ao rictus da paixão e por isso também os meus óculos de lentes fumadas, a pretexto de facilmente me encadear a luz. A sua luz, de que ela não tem a menor consciência

12
Nov09

Pássaros de seda Rosa Lobato Faria

AnnaTree

Coisas Lidas

 

Foi na noite de verão em que ela desceu á cozinha, descalça, com uma camisa de noite branca e os cabelos caídos até á curva do braço, a dessedentar-se na agua do pote, que compreendi que estava irremediavelmente apaixonado por aquela criatura de outra dimensão. Lembro-me de lhe ter dito, pareces um cisne e ela respondeu a limpar a boca as costas da mão, sou um cisne da historia do tio Zebra, aquele que parecia um intruso no meio das aves do lago, um patinho feio cheio de sonhos á espera que lhe caíssem aquelas penas pardas e baças, curioso de saber o que estaria por debaixo. Ainda tenho muitas penas baças, disse ela e sentou-se na borda da mesa de madeira grossa com o pucarinho na mão, arredondou a anca ao inclinar-se para analisar os próprios tornozelos, sem perceber a minha perturbação deslumbrada.

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