David Garrett Csardas Gypsy Dance
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Coisas Lidas
A história reza o seguinte: “Um dia, o burro cansado, sobrecarregado pelo camponês a mando de quem trabalhava, com tantos e tantos fardos às costas, caiu num poço mandado fazer pelo próprio lavrador na ânsia de encontrar água e fortuna. O animal chorou fortemente durante horas e horas, apesar do camponês, disfarçadamente, tentar mostrar-lhe que fazia algo para o tirar do poço, para o seu bem. Finalmente, o camponês decidiu que o burro já estava velho e o poço já estava seco e necessitava de ser tapado de qualquer modo, que realmente não valia a pena tirar o burro do poço. Convidou todos os seus vizinhos para que viessem ajudá-lo. Cada um agarrou uma pá e começaram a atirar terra para o poço. O burro deu-se conta do que estava a passar-se e chorou horrivelmente. Mas, para surpresa de todos, depois de umas tantas pazadas de terra, acalmou-se. O camponês finalmente mirou o fundo do poço e surpreendeu-se com o que viu... com cada pazada de terra, o burro estava fazendo algo incrível: sacudia a terra e dava um passo por cima da mesma; outra pazada de terra e o burro de novo a sacudia e dava um passo encima dela. E assim por diante. De repente toda a gente viu, surpreendida, como o burro chegou até à boca do poço passou por cima da borda e saiu a trote
n se aconselha a audição a pessoas sensiveis
Coisas Lidas
E foi o enormíssimo estrondo. No bairro, todos se inquietaram. Seria a guerra, ali chegada pé ante pé? Seriam os morteiros, mortíferos? No estremunho dos lençóis fazia-se contas á morte.
Juvenal se levantou da cama, encadeou o escuro. A mulher, logo em reparos: ele que deixasse o mundo, ninguém lhes convidara.
- Não vês que há uma situação, mulher?
Ela insistia: nem situação não era. Quando muito aquilo seria um som, desses. Dona Evalinda costurava o marido ao seu medo. A escuridão, hoje em noite, é muito mortal. Mas, o Juvenal nem com isso. A esposa desfolhava o lençol em convite matreiro, lhe prometendo o mais quentinho na cama. Não, ele tinha que ir. Mesmo já cursara os treinos quase militares, desses destinados aos directores. A esposa riu, desdenhosa. O Juvenal, com aquela vasta barriga, chumbara logo nos exercícios de placar. A pança charruava, em agrícolas funções.
- Tenho que ir ver o que se passa.
Evalinda lhe denunciou aquele esboço de valentia. A coragem dele era como os chifres do caracol: só saíam da boca para fora. Mas já Juvenal abrira a porta e rumara os passeios.
Na estrada lhes surgiu, extraordinário, o motivo do estrondo: um camião militar cambalhotado! As rodas ainda giravam, bêbedas. Juvenal deu a volta ao veículo gigante, apreciando o insólito. Parecia um bicho verde-escuro nascido de um grande projecto, uma tartaruga prospectiva-indicativa. Olhou em volta: aquele acidente não tinha aparência. Não havia outra viatura, não havia desses postes do passeio que muito atrapalham a circulação nas estradas.
Juvenal espiou a cabina. O condutor, de cabeça para baixo, ainda remanescia ao volante. Parecia alheio á inversão da paisagem. Estivesse ele morto, suspeitou o residente. Fosse o motorista um mortorista. Mas a farda dele não transparecia uma mancha de sangue. Juvenal bateu no vidro, chamando a atenção do descondutor. Era um tipo cheio de dimensões, a condizer com o camiãozarrao. Tão grande ele era que o uniforme figurava mais ser um unidisforme.
O homem se incomodou, desperto pelos toques na vidraça. Fingiu travar, rodou o volante como se ainda conduzisse. Que era? Como ousara aquele pedestre interromper a sua viagem? O pobre Juvenal logo começou de desculpar-se, tal era a verdade daquele motorista, posto em máxima dignidade, mesmo se de cabeça para baixo. O sinistrado entoou ameaças:
- Não vês que somos um cortejo?
- Um cortejo, pois claro, admitiu o Juvenal. O senhor me seja doador de perdoes, foi a minha esposa que me mandou ver o barulho.
- Que barulho?
Pois, qual barulho? Ilusão de mulher, a Evalinda ela devia de estar a ouvir as suas próprias mexas. Porque aquela noite, tão tranquilinha, só oferecia silêncios. Juvenal rastejava, submissionario
-olha, ali esta ela, de roupão. Vai para dentro, Evalinda, vai que isto aqui esta cheio de cacimbo.
E sorriu-se para o condutor as avessas. Confessou: por momentos, acreditara que aquele camião tivesse virado. Não, calma. Não estou a dizer que está. O que se passa, afinal, é que a rua esta de pernas para o ar. Acontece.
- Estou a pedir guardar o camião.
Juvenal se admirou: de onde vinha aquela voz tão miúda? Olhou, era um molwenwe. O menino vestia-se de rasgões. Vai te daqui, miúdo, suca, não incomoda o cortejo! Vai antes que apanhes.
- Esse é seu filho? – Perguntou o acidentado?
Meu filho? Juvenal se indignou: será que tenho cara de calamitoso? Eu não sou um qualquer, espreite ali a minha fachada residencial, veja a garagem, aquele ele-ele-esse, novinho em página?
- Patrão, estou a pedir guardar o camião.
O motorista, então, saiu do camião. Deu uma cambalhota no ar, sacudiu os ombros, alisou a farda. Juvenal tentou uma simpatia:
- Já o sangue lhe descia na cabeça?
O outro nem ouviu. Inspecionava os vizinhos que, agora, se concentravam no passeio. Falou, com voz patenteada: então vocês não se envergonham, numa altura dessas, em véspera do Congresso, apresentarem uma rua virada ao contrário? Cabisbaixinhos, os moradores se condoíam.
- E agora, por punição, vocês todos vão meter esse camião de cabeça para baixo.
O Juvenal, predispronto, incitou a multidão a ser participassiva:
- Vamos, gente, vamos endireitar o camião.
Endireitar, não, rectificou o motorista. Virar, conforme a alteração da rua. E todos, homens e mulheres, se aplicaram a revirar o gigante de ferro. Concluída a obra, o motorista se meteu no veículo e acelerou fumos. O camião se fez ao escuro.
Os vizinhos, emudecidos, trocavam muito espanto. Nunca ali se juntou tanto sentimento. Os mais velhos suspiravam: pudessem eles reaprender a vida! Foi então que, sobre o silêncio, se fez ouvir o esganiço do menino:
- Patrões, estou pedir guardar a rua.
a todos os apaixonados que não conseguem demonstrar o seu amor e a todos os que conseguem desta forma bonita.
Coisas Mailadas
O homem perfeito é lindo /tem um pouco de mistério
é belo quando está rindo /é belo quando está sério
O homem perfeito é bom /tem um jeito carinhoso
quando fala, em meigo tom /causa arrepio gostoso
O homem perfeito é fino /é solícito, é fiel
tem a graça de um menino /e é mais doce que o mel
O homem perfeito adora /dar flores, botões de rosa,
a uma velha senhora /Ou uma jovem formosa
O homem perfeito tem /energia, não se cansa,
lava louça, cozinha bem, /gosta muito de criança
O homem perfeito é /sensível à grande arte
gosta de dança e ballet /Nunca haverá de magoar-te
Para encerrar a preceito /estes versos que alinhei:
se existe um homem perfeito,/.......................................
o filho d. p... é gay.
I
Escrevo esta simplicidade: descasco-te um fruto no joelho.
Humedecem os dedos no interior da devoção.
O amor. Sei-o bem. Aprendi o ofício. Dedico-me a ele na exaltação das imensas noites. Escrevo-o com esta mão lírica que tocou o mundo inteiro, desde a curva do teu ombro às mandíbulas do esquecimento. Ah...o amor, essa máquina afectuosa a escavar por mim adentro...cabeça, pés, o peito todo. A comer-me onde sou profundo de ti. A martelar-me a carne bêbada nas altas colinas do contemplamento. Digo-te meu amor e penso esta coisa belíssima: a mão a levar-te um gomo à boca...
Coisas oferecidas. Obrigada
Coisas Lidas
(...)
As promessas são a coisa mais ridícula de ser lembrada, porque a eternidade é um segundo. Nos momentos em que sentíamos a respiração um do outro, não existia conhecimento, nem sol. Há memórias felizes que fazem chorar. Só queria que o meu corpo caísse através da janela. A cara pesada no chão, Os ossos contra a pedra dura. Mas hoje o cigarro já se apagou entre os meus dedos sem eu perceber. O aperto no peito não me deixa olhar pela janela.
Porque me sinto um velho muito velho sentado ao sol, em frente á casa assombrada.
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