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COISAS CANTADAS
Onde queres revólver sou coqueiro, onde queres dinheiro sou paixão
Onde queres descanso sou desejo, e onde sou só desejo queres não
E onde não queres nada, nada falta, e onde voas bem alta eu sou o chão
E onde pisas no chão minha alma salta, e ganha liberdade na amplidão
Onde queres família sou maluco, e onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon sou Pernambuco, e onde queres eunuco, garanhão
E onde queres o sim e o não, talvez, onde vês eu não vislumbro razão
Onde queres o lobo eu sou o irmão, e onde queres cowboy eu sou chinês
Ah, bruta flor do querer, ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres o ato eu sou o espírito, e onde queres ternura eu sou tesão
Onde queres o livre decassílabo, e onde buscas o anjo eu sou mulher
Onde queres prazer sou o que dói, e onde queres tortura, mansidão
Onde queres o lar, revolução, e onde queres bandido eu sou o herói
Eu queria querer-te e amar o amor, construírmos dulcíssima prisão
E encontrar a mais justa adequação, tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés, e vê só que cilada o amor me armou
E te quero e não queres como sou, não te quero e não queres como és
Ah, bruta flor do querer, ah, bruta flor, bruta flor
Onde queres comício, flipper vídeo, e onde queres romance, rock'n roll
Onde queres a lua eu sou o sol, onde a pura natura, o inceticídeo
E onde queres mistério eu sou a luz, onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro, e onde queres coqueiro eu sou obus
O quereres e o estares sempre a fim do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal, bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal, e eu querendo querer-te sem ter fim
E querendo te aprender o total do querer que há e do que não há em mim
COISAS LIDAS
Resposta de uma velha de 94 anos de São Tome e Princepe a pergunta:«o que sente que a vida ainda tem para lhe dar?» « olha ,meu filho,. sei que quando ponho os pés no chão, ainda levanto muita poeira. Por isso é aproveitar e continuar a andar»
COISAS LIDAS
«nuca cometo o mesmo erro duas vezes
já cometo duas tres
quatro cinco seis
até esse erro aprender
que só erro uma vez»
Mãe; esqueci me da tua voz e tu não podes imaginar como lamento.
O nosso mundo é feito dos que estão e dos que partiram. Somos o que tocamos com as mãos, mas também a memória dos que morreram e até a recordação dos que existindo deixaram de nos bater à porta. Por vezes, escutamos conselhos de amigos; noutras procuramos as imagens dos que se foram e imaginamos o que nos diriam. É aí que falho. Se fechar os olhos consigo vê-los a todos, mas se os tentar escutar nem sempre os distingo – no jardim dos meus mortos há vozes de que não me lembro.
Retirado de SÓ ENTRE NÓS (Chiado Editora 2013) De Luis Osorio
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