Livro impressão indelével Camilo Castelo Branco
Coisas lidas
Quando o coração espera mais que o juízo, é amor.
Se só há uma sepultura para cada homem, morrer posso morrer várias vezes. A impressão é indelével. E persiste
A candura se rende ao Império dos instintos
Gozo que vem da glória de possuir na morte, aquela que tantas lágrimas o fez chorar em vida, exaltação e gozo que provém de uma caveira.
Nunca te contei, meu caro Barbosa, o fecho ou desfecho de uma afeição dos meus 15 anos? Creio que não.
Estás farto de confidencias do homem; as da criança, até muito tarde criança do coração, essas começam hoje o teu valor para mim; porque não sei o que há entre a puerícia e caducidade, que as lembranças mais vizinhas do berço andam juntas aos tremores do túmulo!
Disseram-me que uma lei da senhora Dona Maria I me deserdava. A boa da rainha, se tivesse chamado mais cedo um certo bispo, não legislaria tão cruamente para os filhos do pecado. Denominava-se a piedosa, pela mesma razão que um rei nosso, soprando fogueira de 20.000 hebreus, se achou o piedoso. A boa da história é uma trapalhona!
Permaneci quieto, não sei que tempo, e com os joelhos enterrados e a face pendida sobre a face morta. Não sei dizer-te o que eu pensei. Talvez nada! A alma neste lances creio que se aniquila. Há dores que o homem não pode, e Deus quando as dá assim, , permite a letargia, a morte passageira, a paralisia dos órgãos condutores da impressão.
falta dizeres-te, meu caro Barbosa, que o esqueleto de Maria está ano Do meu cunhado. A caveira e do alvura de jaspe. Os dentes conservam o verniz de esmalte. As falanges daquelas mãos que eu beijava não têm a mais pequena mancha. O seio onde lhe bateu coração está vazio; todavia a simétrica inserção das costelas fez-me lembrar a cúpula, numa urna, onde um anjo do céu vai buscar um coração que não era de cá.
pode-se morrer mais que uma vez. A sepultura é que é só uma para cada homem . É este o segredo do epitáfio de Scoto :Semel sepultus, bis mortuus.
se eu morrer na tua terra, dá-me este epitáfio, ainda que seja esculpido numa tábua. Sepultado uma vez, duas vezes morto.
não há extravagância imaginária de que não seja capaz o coração do homem.