AS MADRUGADAS DE LINDA LÊ LIDO II
coisas lidas
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ela queria um miserável transformado, pela graça da sua generosidade, num príncipe transido de amor. Teve um marido que refreava os arrebatamentos e olhava como um dado adquirido a solicitude ela em satisfazer-lhe todos os desejos, consulta-lo a propósito da mais insignificante disposição domestica e em passeá-lo através do mundo para que ele descobrisse outros céus. A minha mãe sentia atitude do meu pai, que insistia no abandono, como uma traição e este respondia com uma frieza altiva ao cenário de magia que ela tinha projectado. O dinheiro que planeara lançar aos pés do amante, tornou se com o tempo o instrumento da sua vingança . servia-lhe para humilhar aquele que não conseguira vergar á sua vontade. O que teria distribuído em abundância , desatou a reivindica-lo como seu, e a riqueza, que teria tocado por uma palavra de submissão, a riqueza criou entre ambos uma fronteira inultrapassável.ele acusava-a agora de velhacaria e cobiça. Ela sentia-se enganada .pouco habituada a encontrar resistência, a reflectir sozinha, não teve outra saída senão adaptar-se ao papel de megera. lamentava o seu erro, mesmo se, como o meu pai , as mais violentas paixões ainda a movessem. que as manifestações de ódio entre dois seres possam estreitar o amor, que a vontade de combater o outro possa forjar-se no desejo de o arrebatar por completo e as humilhações recíprocas nascer de um fervor contrariado, eis um paradoxo que os meus pais demonstravam todos os dias. Os dois inimigos viviam ambos no desejo desesperado do outro, numa obsessão recíproca. Embora lhes agradasse invocar a separação, continuavam certos de que nada os separaria: tinham atravessado juntos todos os estados do amor, da conquista á dilaceração, da fusão á ruína. eram como duas substancias inflamáveis que não podem aproximar-se sem se incendiar e destruir uma á outra.