A menina é filha de quem? De Rita Ferro
COISAS LIDAS
(…)
Fernando Pessoa, o poeta, era visita regular da casa de Fernanda de castro
- Quer um chá, Fernando?
- Pode ser- respondia num vagido.
- Se calhar preferia que eu lhe oferecesse um licor, mas sabe? Como não bebo…
- Não, não- dizia ele, embaraçado. – Não é a hora nem o lugar…
- Dizem-me que o Fernando bebe um bocadinho…é verdade?
- Sim, sim-respondia ele contrito.- Tudo o que disserem de mim é verdade…
E acrescentava inaudível:
- Sobretudo se mentirem.
(…)
Fernanda tinha a vida á espera, pelo que sem querer, revelava impaciência. Gostava de escrever de manhã e Fernando Pessoa à noite, pelo que, muita activa aquela hora, afligia-a ter ali uma pessoa a querer falar, a ser e a não ser ao mesmo tempo. Era uma mulher vital e ele um homem que, para acender o mundo tinha que viver nas trevas (…)
Alem do mais Fernanda nunca conseguira descortinar exactamente a intenção das visitas daquele amigo do marido que só a procurava quando este não estava em casa.
(…)
Só mais tarde, pelas sobrinhas, se soube que Fernando Pessoa escondia uma devoção silenciada por ela. Um dia, parece que encontraram um bilhete pequenino, escrito pela sua mão com letras microscópicas: gosto da F.C.