Estilhaços de Júlio Machado Vaz
Coisas lidas
Meu pai não teve sorte, os últimos dois anos foram terríveis. Quando me confidenciou, pela primeira e última vez, que estava muito fatigado, percebi que se despedia e poupei-nos a banalidade de mau gosto. Segura-lhe a mão, tarde e a más horas, com mais de 30 anos de atraso. Ainda e sempre desencontrados, apagou-se na minha ausência, poucos minutos antes de eu chegar. Essa pequena distância de espaço e tempo resumiu nossa vida.
(...)
Oito meses volvidos , estamos juntos como nunca estivemos. O silêncio mantém-se, mas não a distância, levo-o ao colo dos neurónios para todo lado. O avô que ele, neto favorito, venerava, escreveu um dia que só quando a nossa mãe morre abandonamos verdadeiramente a infância .
Não deixarei morrer nada do que fui dentro de mim, preciso desesperadamente da memória para seguir em frente.